MC Lan defende funk global sem perder estilo ‘maloqueiro’: ‘Não temos que imitar os gringos’
“O Nirvana mostrou isso, o Tupac também”. MC Lan cita a banda de rock e o rapper dos EUA como exemplos de artistas que estouraram sem perder a “essência” – ou o “jeito maloqueiro”, como define. O brasileiro defende o mesmo princípio para exportar nosso funk.
O plano de exportação está em curso. Lan fez a ponte entre Ludmilla e Skrillex na faixa “Malokera”. Também armou a “Rave de favela” com Anitta e Diplo. Nesta sexta-feira, lança “I’m F.R.E.A.K”, com mais um americano, o rapper Desiigner.
A faixa vai estar no disco “Bipolar”, em que ele promete parcerias com o sul-coreano Psy, o americano Wiz Khalifa, o nigeriano Runtown, o portorriquenho Don Omar, a mexicana Snow Tha Project, entre outros pelo mundo.
O rapper nasceu em Diamantina (MG) e foi criado em Diadema, região metropolitana de São Paulo. Há quatro anos ele estourou no funk de SP com hits pesados como “Rabetão” e “Ô Xanaína”, marcadas pela voz grossa e o jeitinho ogro de Lan.
Mas Caio Alexandre Cruz sabe aonde quer chegar. Ele explica as conexões com DJs estrangeiros, diz que há uma campanha nos bastidores para a indicação de “Rave de favela” à categoria eletrônica do Grammy (principal, não latino) e resume seu plano:
Leia a conversa com o G1 abaixo:
G1 – Como surge, na prática, uma parceria internacional como essa que você está lançando com o Desiigner?
MC Lan – A primeira não fui eu que procurei. O Skrillex veio atrás. Ele se apaixonou pelo funk quando veio com o Diplo ao Brasil. E me procurou para fazer uma música depois. Em vez de deixar só nisso, só uma música, eu amplei meus laços.
Esse é o momento de fazer acontecer. Conheci o Ty Dolla Sign, o Wiz Khalifa, o Desiigner. A Anitta abriu muitas portas para mim, a Ludmilla também. Está virando uma troca de amizades, não de favores. Tem muito artista que paga pelo “feat”, mas eu não. Os artistas querem entrar de verdade.
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G1 – No caso de “Malokera” e “Rave de favela”, em que momento você entrou?
MC Lan – Eu só faço músicas em que coloco a mão. A maioria eu mostro para o gringo e ele termina. A “Rave de Favela” foi o Tropkillaz que começou, mas eu mexi também. O Diplo colocou bastante a eletrônica, mas a “brisa” funk, agressiva, sou eu que coloco – e não só na voz.
“Rave de Favela” tinha a ideia de ser Anitta e a Pabllo. Mas a Pabllo não conseguiu participar, eu não consegui falar com ela. E aí ficou a Anitta.
“Malokera” foi um trampo que começou comigo e o Troyboy. Mandei para o Skrillex e ele adorou. A gente tem mais quatro músicas prontas, preparadas para soltar.
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Troyboi, MC Lan, Ludmilla, Skrillex e Ty Dolla $ign estão juntos em ‘Malokera’ — Foto: Reprodução/YouTube
G1 – Desde os primeiros hits, tipo “Rabetão”, você produzia?
MC Lan – Todas sou eu que começo a produção. Aí mando para outro produtor finalizar, porque eu não entendo de masterização, mixagem. Só do grave, da batida, do riff, o synth, sou muito autodidata nisso. Eu gosto de participar de tudo, inclusive com os gringos.
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Capa de ‘I’m F.R.E.A.K.’, parceria de MC Lan com o rapper americano Desiigner, do hit ‘Panda’ — Foto: Divulgação
G1 – Você gravou com as três cantoras de funk mais populares do Brasil: Lexa (“Sapequinha”), Ludmilla (“Malokera”) e Anitta (“Rave de favela”). Como foi com cada uma?
MC Lan – Eu, como admirador do mundo feminino, não poderia deixar de querer trabalhar com elas. Estão quebrando vários tabus. Tem muita mulher entrando no funk por causa delas. A música com a Lexa abriu as portas para ela e para mim. A Lud também não tenho palavras. E Anitta é minha madrinha, minha mamãe.
Eu queria gravar com a Pabllo e tenho um projeto parado com a Ivete. Das três principais de funk, ir para outros gêneros.
G1 – Com relação às parcerias com os gringos, o que esses caras encontram no funk daqui que não existe na Europa ou nos EUA?
MC Lan – A gente tem a brasilidade, a favela. Do mesmo jeito que o reggaeton está acrescentando muito no mercado e na cultural mundial, o funk também pode. Eles estão percebendo isso. O Black Eyed Peas soltou ma música com o Nicky Jam e o Tyga que é o funk. A Jennifer Lopez também faz um funk sem nenhum brasileiro. Eles até tentam copiar a favela, mas não conseguem.
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MC Lan — Foto: Divulgação
G1 – Mesmo em projetos mais comerciais como essas parcerias com cantoras e com gente de fora, é difícil manter o estilo “maloqueiro” do começo?
MC Lan – Lá fora eles não acham feio esse estilo nosso maloqueiro. Eles acham legal, acham f*da. O Diplo fez questão de pegar minha Juliet (óculos), colocar no rosto e gravar o clipe. Para mim isso é mágico. A gente não precisa mudar. Pode manter a essência para chegar lá.
Não tem nada mais legal do que subir num palco fora usando a sua roupa de sempre. Sem tirar o chinelo, de roupa da Cyclone, ser favelado do jeito que você é. Outras pessoas já quebraram esse tabu lá.
Os jurados estão vendo se “Rave de favela” vai entrar para o Grammy eletrônico. Se a gente concorrer, se Deus quiser, eu quero quero pisar no palco do Grammy do jeito mais Diadema possível, como eu ando com meus amigos.
O Nirvana mostrou isso para nós, o Tupac também, muitos artistas. Quero mostrar que dá para manter a essência.
G1 – Existe uma campanha para a indicação de ‘Rave de favela’ ao Grammy na categoria eletrônica, é isso?
MC Lan – Sim, a votação está rolando. Não sei se vai entrar, mas está sendo aceita. Lá fora os gringos abraçaram. Acho que o Brasil só tem a ganhar com isso.
G1 – Outro dia um dos assuntos mais comentados no Twitter foram fotos suas na época em que você era emo. Como foi essa época?
MC Lan – Viralizou, né? Eu sou um camaleão, desde criança. Já tive minha fase que cantava rap, rock, abri o show da banda Hori, do Fiuk.
Sou muito fã de NX Zero, Fresno. Eu gostaria de cantar uma música com o Di Ferrero e o Lucas Silveira. Eu e eles na mesma música. O rock é uma música elementar como o funk. Eu não tenho vergonha de aparecerem essas fotos, fico feliz.
G1 – Você já foi preso por um ano. Como foi passar de uma experiência dessa e virar um cantor?
Gosto de levar a vida sem me vitimizar nem glorificar o que fiz. Glorificação é poder ter saído do crime de cabeça erguida, respeitando e sendo respeitado por todo mundo.
Música é uma salvação para nós. Você sai achando que não tem mais trabalho, não tem mais nada na vida, com com a carteira suja. Em qualquer emprego que chegar, é ex-presidiário.
A gente está falando de Grammy agora. Penitenciária e Grammy não estão na mesma linha. Só tenho a agradecer. Eu não tenho família mais. Acho que a minha mãe está junto de Deus me abençoando.
Fonte:G1